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Um parque em conflito

Por I Bianca Kethulen

Quem tiver acesso a fotos antigas e recentes do Cocó pode perceber como elas revelam mudanças ocorridas no Parque. Por isso, todas as fontes ouvidas nesta reportagem já adiantam: é necessário ficar atento e cuidar do Parque, que foi regulamentado em 4 de junho deste ano. Um dos desafios é sobre como preservar áreas como as dunas, que vêm sendo destruídas pela indiferença das autoridades e pela desatenção do ser humano. Elas estão com apenas 17% de área preservada e não estão incluídas na poligonal, que é a Unidade de Proteção do Parque do Cocó. Para entender o que isso significa, lembre-se do desenho de um polígono. Lembrou? Pois não é coincidência. Essas mesmas linhas fazem alusão ao contorno de toda a Unidade, que forma um polígono.

As Dunas milenares do Cocó.                                                                            

                                                                                                              Foto: Bianca Kethulen 

Mas, por que as dunas estão fora dessa poligonal? Jeovah Meireles, professor do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Ceará (UFC) e membro do Conselho Gestor das Unidades de Conservação da Sabiaguaba (CGS), sugere que são as possíveis pressões do capital imobiliário e financeiro, que, ao longo dos anos, vem devastando esses sistemas ambientais.

O geógrafo defende que é preciso impedir que sejam realizadas construções capazes de prejudicar o ecossistema de dunas e de reservatório de água porque isso pode afetar a possibilidade do que classifica como “futura cidade sustentável”.

Ele destaca que a vegetação da Arie, a Área de Relevante Interesse Ecológico, proteção permitida para as dunas do cocó em 2009, ameniza o clima e espalha as ilhas de calor existentes em Fortaleza, por exemplo. Os benefícios da Arie das Dunas podem ser extintos com a construção de prédios sobre a área natural. Isso preocupa ambientalistas e outras pessoas que se importam com as outras áreas verdes da cidade também.

O professor Jeovah Meireles lembra que a questão foi discutida na Câmara dos Vereadores no dia 11 de agosto de 2017, “onde os parlamentares agiram de forma muito rápida e tinham um foco muito específico”. Na análise do professor, os vereadores assinaram um protocolo pela manhã, retirando a Lei nº 9502, que criou a Unidade de Proteção da Arie do Cocó, e, na tarde do mesmo dia, o prefeito aprovou. Para o professor, isso “impossibilitou” que outros cidadãos tivessem acesso, através de debates, a documentos para a colaboração a decisão da retirada da lei ou intervenção diante da ação.

O advogado ambientalista João Alfredo afirma que a sugestão para preservar o “cordão de Dunas”, Arie do Cocó, Dunas da Sabiaguaba, Cidade 2000 e Praia do Futuro seria inseri-lo na Poligonal ou que o Governo criasse áreas de proteção. “Quando surgiu a proposta, todas as dunas ficaram de fora”, conta. Ele acredita que o acordo foi pensado para manter a área do rio do Parque, e não para proteger as dunas - supostamente por conta de interesses imobiliários.

As Dunas do Cocó estão seriamente ameaçadas.                  Foto: Reprodução Google
 

Outra pendência judicial que envolve o Parque é o adiamento da resolução sobre a permanência das comunidades tradicionais na Boca da Barra e a Casa de Farinha, nas margens do Rio Cocó. O movimento dos ambientalistas requer que essas áreas não façam parte do Parque, mas sejam Reserva Extrativista (Resex). “Ele acrescenta que isso permitiria a coexistência entre comunidades tradicionais e meio ambiente, permitindo a prática das suas atividades e o extrativismo vegetal.”

As questões relacionadas ao Cocó são complexas, afinal, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário sentenciam os destinos do Parque e de todos os cidadãos

Apesar de o decreto ter reconhecido a existência das comunidades e autorizar as suas atividades, estas só serão declaradas como tradicionais após a realização de um estudo. “É um absurdo, pois a comunidade tradicional não é o Estado quem define”, critica. Ele menciona a importância da realização de um levantamento antropológico para analisar os usos e costumes das comunidades, como, por exemplo, a pesca e as festas. João Alfredo destaca que o mesmo foi feito para a comunidade da Casa de Farinha, mas não com um decreto, e sim com a realização de um termo de compromisso.

Os processos envolvendo o Cocó seguem acontecendo e envolvem também a criação do Plano de Manejo, documento que vai analisar as áreas destruídas e apontará ações específicas para recomposição. O Plano é executado pelo Conselho Gestor do Parque, que vai fazer uma análise detalhada do território. O “impasse”, segundo João Alfredo, está no fato de o plano de manejo ainda não ter saído do papel. As questões relacionadas ao Cocó são complexas, afinal, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário sentenciam os destinos do Parque e de todos os cidadãos.

A cobrança

Perguntamos à Secretaria de Meio Ambiente do Estado do Ceará  se existe algum projeto para as dunas e se havia possibilidade delas entrarem para a poligonal. Por e-mail, o articulador das Unidades de Conservação Ambiental, Leonardo Almeida Borralho afirmou que: “No momento não existe projeto para as dunas ou previsão de inclusão na poligonal do Parque Estadual do Cocó, considerando que são terrenos privados cujo valor de desapropriação seria incompatível com a atual realidade financeira do Estado. Entretanto tais unidades geomorfológicas devem ser tratadas como Áreas de Preservação Permanente (APP), de valor ambiental extremamente relevante para o rio Cocó e inclusive para a cidade de Fortaleza, diante de seus inúmeros serviços ecossistêmicos e proteção legal do Código Florestal”.

Questionamos ainda como e quando deve ser feito o plano de manejo do Parque. “Com critérios técnicos e com uma análise ambiental considerando os principais aspectos da biodiversidade, geodiversidade e sociodiversidade, com o decorrer do processo sendo executado de forma transparente, participativa e dialogada com os atores sociais pertinentes”, afirmou Borralho.

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