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Um Cocó de tantos afetos
Um Cocó de tantos afetos...

Foto: Magno Paz

Por l Ana Cláudia Lemos e Ivina Rocha

O dicionário chama de afeto os sentimentos ou emoções em diferentes graus de complexidade, que designam um estado da alma. Afirmam os filósofos que somos corpos que se relacionam com outros corpos e, que, quando somos mutuamente afetados, de forma simultânea ou não, surgem os sentimentos. Estes podem ser de alegria, quando a emoção nos toma de modo positivo, permitindo sintonia com a experiência – o bom encontro. Ao contrário, quando o encontro nos traz limitações ou constrangimentos, os sentimentos são de tristeza.

  Um espaço para além do caminhar                                                                                                                     Foto: Ana Cláudia Lemos

Estar no Parque do Cocó é vivenciar de forma abrangente e simultânea todas as relações que envolvem aquilo que muitos buscam: a integração do homem com a natureza. Nesse espaço multicor e diverso é impossível não ser afetado e/ou afetar o ambiente.

Caminhando pelo Parque, de forma imediata e despretensiosa, podemos observar a multiplicidade dos frequentadores. O encontro de gerações é contínuo.
Cedinho, pelas manhãs, veem-se os mais jovens que buscam o Parque para o exercício diário mais intenso, correndo ou andando de bicicleta. No mesmo cenário também se encontram os que têm um leve caminhar, mais compassado e regido pelo prazer do exercício moderado ou pela possibilidade de tomar um pouco de sol e de trocar ideias com amigos que, em alguns casos, parecem ser de longa data. Fácil perceber ternura nesses encontros. Ternos também são os passos infantis, guiados pelos pais ou professores, sejam nas inúmeras possibilidades de brincadeiras ou no aprendizado lúdico das exposições e mostras que são constantemente realizadas.

Deitar-se na grama e deixar-se ficar ali apenas olhando o céu de um azul intenso é a opção de muitos. Aproveitar a sombra das árvores, deixando que elas deem teto a um piquenique em família ou a dois é algo comum. E, não raro, a tecnologia participa de tudo, quando câmeras fotográficas ou de celulares são chamadas a realizar registros.
A eternização de momentos encontra no parque um ambiente propício. Início de namoro, pedidos de noivado, prévias e álbuns de casamento, formaturas, batizados, aniversários, tudo é testemunhado pelo Cocó e para sempre guardado na memória e nos drives. Sara Ruth e Fabrício escolheram o Cocó para as fotos de seu book de casamento. “Vamos nos casar em breve e escolhemos o Parque do Cocó para fazermos o nosso book pela sua beleza, por ser o exemplo de natureza da nossa cidade e porque combina com a gente. Gostamos de liberdade e o Parque representa isso”, disse Sara.
Fonte constante de inspiração, o Cocó atrai demonstrações artísticas de todas as nuances. Dos shows musicais que são constantemente realizados embalando diferentes vertentes até a pseudossolitária atividade de pintar, tudo é possível.  O designer gráfico e desenhista Gabriel Pinheiro gosta de traduzir o Cocó em suas telas. “Eu aproveito o silêncio dentro dessa cidade caótica e às vezes me comovo diante de tantos tons de cinza e de verde. Vejo cores em todo o lugar. Desenhar e pintar por aqui é muito relaxante e me equilibra”.

Fonte de inspiração para artistas                                                                                                                                                                                                                         Foto: Ana Cláudia Lemos

Animais de estimação são bem-vindos, mas o dono precisa ter a consciência de que o ecossistema local difere da sua casa, devendo realizar a coleta imediata de eventuais dejetos. Elementos alheios ao hábitat do Cocó o afetam negativamente e desequilibram o ambiente. A dicotomia entre o bem e o mal – entre o que afeta positivamente e, ao menos tempo, negativamente – tem realce quando a questão são os inúmeros felinos domésticos que vivem no Parque. Se, por um lado, as crianças, que muitas vezes não têm em casa um bichinho de estimação, se desmancham em carinhos pelos gatos e passam longo tempo a acariciá-los e tendo o contato animal recomendado por especialistas médicos, por outro, esses mesmos gatinhos impactam o ambiente, pois levam para lá questões que não estão relacionadas aos animais silvestres ali encontrados, que padecem com consequências às vezes fatais.

Quem ama cuida

Nas águas também são encontrados itens não originários dali. Francisco Araújo, que conduz o barco que faz o passeio pelo rio desde 1991, afirma que existe uma ação que pode ser realizada por quem desejar. “Disponibilizamos gratuitamente um caiaque para quem desejar passear pelo rio. O que pedimos é que a pessoa traga para nós todo o lixo que encontrar. Ninguém é obrigado a trazer nada, mas se trouxer, a natureza agradece”.

O Parque do Cocó reúne todas as gerações e tribos                                                                                                                                                                                         Foto: Ana Cláudia Lemos

O Cocó pede socorro e reforço em educação ambiental                                                       Foto: Ana Cláudia Lemos

A ausência de educação ambiental é um fator que precisa ser melhorado, de acordo com Maria Luiza, Presidente da ANIMAS – Associação de Moradores e Amigos da Sabiaguaba. Ela afirma que os nativos que residem na área do Parque do Cocó são frequentemente alertados e, em algumas ocasiões, até notificados, como a abertura de fossas sépticas em local inadequado e o manejo incorreto da fauna e da flora, mas ela conta que eles o fazem  por não conhecerem o procedimento correto. “Se a população tivesse de forma mais constante e prática, cursos de educação ambiental, sobre como fazer para conviver corretamente com o rio e com o mangue, certamente faria tudo da forma certa e não teríamos o impacto que se vê”.  Ela lembra com saudade do seu tempo de menina, quando tinha no Cocó tudo o que precisava para viver com dignidade e alegria. Recorda das espécies de animais e plantas que já não se encontram mais e de como o rio era farto em peixes.
Há quem cuide do Cocó como quem cuida de um cômodo querido de sua casa.  Francisco Pereira, o Seu Chico, realiza trabalho voluntário lá há 25 anos. “Sou responsável por zelar o campo durante todos esses anos. Conheço cada palmo seu. Quando, no começo do ano, chove, o terreno vira rio; quando chega maio, vira campo”. Seu Chico tem um time de futebol que compete com outras equipes, principalmente em jogos aos sábados. “Esse campo tem ajudado muitas pessoas a saírem das ruas - onde só existe maldade -, proporcionando momentos de lazer para quem gosta de futebol. E é nele que pessoas se encontram, se divertem e criam boas amizades. Sou a prova viva disso. Aqui é o meu lugar”, conclui seu Chico.

Valoração econômica 

O Parque também dá apoio econômico à população                                                                                                                                                                                            Foto: Ana Cláudia Lemos

Lourenço Santos é vendedor ambulante no Parque há dois anos e tem ali o seu ganha- pão. “Trabalho aqui e é onde eu ganho minha renda, mas o apreço que sinto pelo parque vai além do que ele me proporciona financeiramente. É o ambiente mais próximo de uma natureza pura, que nós, fortalezenses, podemos usufruir. De toda forma tenho muito zelo por ele. Sua natureza, mesmo cercada por tantas paredes, é o que me encanta”.
Atribuir valor a um ativo ambiental não é tarefa fácil. No Parque do Cocó não se paga para usufruir de tudo o que ele oferece aos visitantes. Sabe-se, no entanto, já haver estudos para definir a valoração do espaço, a partir de pesquisas que vêm sendo aplicadas junto aos frequentadores, no sentido de estimar qual o valor que eles admitem pagar para o acesso.

O que se conhece é que famílias são sustentadas com a atividade econômica informal que é praticada no parque.  
As paredes que cercam o Cocó fazem do bairro onde se localiza a sua parte turística uma das áreas mais valorizadas e sujeitas à especulação imobiliária. Uma ampla discussão sobre a convivência entre o desenvolvimento e a sustentabilidade do parque, envolvendo a grande urbanização de seu entorno, apresenta-se de forma constante na sociedade.
E o parque caminha, numa simbiose constante entre o impactar o seu entorno e por ele ser impactado. Um Cocó de tantos afetos...!
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